segunda-feira, 23 de julho de 2012

INTERIOR PAULISTA


Fevereiro de 1989

De dia o cheiro era do jardim da casa onde cresci. Pouco mais tarde (se é que seis horas da manhã pode ser considerado um horário mais ou menos tarde) sempre tinha aquele cheiro de alho que vinha da marmita que a vizinha preparava para o marido. Era fácil adivinhar o cardápio do dia nas residências ao redor.

Alguns moradores da esquina vi crescer e um da direita vi morrer. Na família que morava do outro lado tínhamos plena confiança e eram eles que guardavam as chaves da nossa casa em situações de emergência (como o aparelho celular fazia falta naquela época).

Não era difícil saber que o João e a Rosa discutiam todos os dias. Ju e família assistiam TV em alto volume e davam gargalhadas ao ver o Programa do Jô em um horário que a maioria dos vizinhos já esquentava as camas com os corpos preparados para a labuta do dia seguinte.

Por lá são poucos os prédios, mas nas ruas tem carros novos daqueles que nem anúncio na televisão tem ainda. O que não tem por lá é cheiro de trânsito. Depois que a noite cai, tem lugar da cidade com aroma de cachorro-quente, gosto de terra molhada e morador sentado na cadeira de área, colocada estrategicamente na calçada, para observar o movimento nas ruas. Também tem lugar com cheiro de mato, mato mesmo, e muitas casas em construção.

Foi nesse lugar, com menos de duzentos mil habitantes, que nasci e cresci cercada por valiosas percepções. E é para essa mesma Terra que volto sempre que preciso recarregar as energias. Ter raízes é fundamental para manter a base estruturada.

P.S.: Recalculando rota e fazendo reajustes!

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